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O INSTITUTO GREGORIO BAREMBLITT nasce do encontro de um grupo de amigos com um desejo comum de reinventar novas práticas sociais. Para tanto constituímos uma associação sem fins lucrativos. Seu nome é uma homenagem ao psiquiatra, psicoterapeuta, professor, pesquisador, analista e interventor institucional, esquizoanalista, esquizodramatista e escritor Gregorio Franklin Baremblitt. Nosso desejo é que este dispositivo tenha uma inserção social e que possamos construir com nossa comunidade um Outro Mundo Possível.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

10 Anos da Lei 10216/01 que instituiu a Reforma Psiquiátrica Brasileira!!!

Tribuna Livre da Câmara de Vereadores de Frutal:

Excelentíssimos Membros desta Casa, gostaria de agradecer a oportunidade de estar aqui esta noite a todas as vossas excelências, na pessoa do Senhor Presidente, excelentíssimo vereador José Adão da Silva, numa noite muito especial para nós, do Movimento da Luta Antimanicomial, quando estamos comemorando os 10 Anos da Aprovação da Lei 10216 que instituiu a Reforma Psiquiátrica Brasileira. Agradecer a todos os presentes, em especial aos nossos usuários e familiares.

Não poderia, também, deixar de agradecer a esta Casa, espaço que prima pelo diálogo franco e aberto, onde as divergências são entendidas como expressão legítima da democracia, de discussão das políticas públicas, pela homenagem a mim prestada, por iniciativa da vereadora Maíza Sinhorelli Nunes, nossa companheira de trabalho e grande amiga, precursora desta luta pelo respeito, dignidade e inclusão da diferença.

Espero fazer jus a tal homenagem que creio ser fruto do trabalho cotidiano que estamos desenvolvendo na Saúde Mental de nosso município juntamente com outra grande amiga, a Coordenadora de nosso CAPS, Arlete, e os demais trabalhadores da Saúde Mental, a quem eu cumprimento através de minha esposa, Doutora Ludmilla, os grandes responsáveis pelas conquistas até aqui alcançadas. Agradecer, também, a nossa Prefeita Ciça e ao Secretário de Saúde, Dr. Plínio pela confiança e apoio irrestrito que têm nos dado para que este sonho seja possível, que é cuidar melhor a cada dia de uma clientela que tanto sofre por diversas mazelas sociais, familiares, culturais e éticas. Estender esta homenagem aos nossos usuários e seus familiares, razão de nosso trabalho e por quem estamos aqui no dia de hoje.

Iniciamos neste dia, com nossa vinda a esta Casa, a IV Semana da Luta Antimanicomial de Frutal e I Semana da Luta Antimanicomial do Pontal do Triângulo Mineiro, em comemoração aos 10 Anos da Reforma Psiquiátrica Brasileira. Nossas comemorações se darão de forma conjunta em quatro cidades de nossa região, Frutal, Iturama, Fronteira e Itapagipe. Receberemos, amanhã, num evento no qual todas as Vossas Excelências já foram convidadas, um querido companheiro, o presidente por quatro gestões da Associação Brasileira de Redutores de Dano (ABORDA), Domiciano Siqueira, que desenvolve um belo trabalho junto à clientela que faz uso abusivo de álcool e outras drogas. Neste encontro, contaremos com profissionais de toda nossa região, além de Uberaba, Uberlândia, Araxá, Barretos entre outras cidades. Na quarta, promoveremos atividades artísticas, exposição de trabalhos manuais, uma grande confraternização entre os usuários da Saúde Mental, seus familiares e os trabalhadores da Saúde Mental, em Frutal, no Dia Nacional da Luta Antimanicomial. Além de cineclubes em Itapagipe, ainda, na quarta, e Iturama, na quinta. Conferências em Fronteira e Iturama, na sexta.

Mas como estamos hoje, passados 10 anos da Aprovação da Lei 10216?

Temos cadastrados junto ao Ministério da Saúde, no momento, 1650 CAPS, 571 residências terapêuticas, 640 iniciativas de geração de trabalho e renda. Tínhamos em 2002, mais de 52 mil leitos psiquiátricos, hoje são 32735 leitos.

Em nossa cidade, também, a cada dia tentamos melhorar nossa assistência a essa clientela com grave sofrimento psíquico. Atendemos em nosso CAPS, 204 usuários cadastrados, além de muitos que buscam nossa ajuda. Quase não utilizamos as longas internações, quando necessitamos de um suporte noturno, recorremos ao Hospital Frei Gabriel. Oferecemos três projetos de geração de trabalho e renda. O Bazart’s, que comercializa roupas, sapatos, colares, brinco e rende a cada 15 dias aproximadamente R$ 100,00 para os usuários participantes. Contribuindo, também, para que os demais se vistam melhor, além de ser um dos espaços sociais mais frequentados do CAPS e financiar outro Projeto de Geração de Renda que é a Cozinha Terapêutica, onde são produzidos coxinhas e risoles. O terceiro projeto de geração de renda é o “Sabão Consciente”, em processo de finalização, com financiamento do Ministério da Saúde, no qual pretendemos incluir 10 usuários do CAPS e 5 familiares, onde captaremos óleo de cozinha para a produção de um sabão biodegradável. Dispomos de uma residência terapêutica para aqueles usuários que não possuem família ou tiveram os laços familiares rompidos, onde moram três de nossos clientes.

Nestes dez anos de Reforma Psiquiátrica, os avanços foram notáveis, mas temos muitos desafios para sua consolidação.

Continuamos a enfrentar a "cultura da internação". Esta cultura, o "desejo do manicômio", que, muitas vezes habita em nós mesmos, nos familiares e na sociedade em geral. Acreditamos que cuidar é mais que um ato, como internar, é uma atitude. Portanto abrange mais que um momento de atenção, de zelo e de desvelo. Representa uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de envolvimento afetivo com o outro. Isto é o que praticamos no CAPS no nosso dia-a-dia.

Fazer caber a diferença. Para tanto investimos nas atividades artísticas, culturais, inventamos pequenos filmes onde nossos usuários podem expressar sua criatividade sem amarras.

Não podemos deixar de mencionar o cuidado a clientela que faz uso abusivo de álcool e outras drogas, que tanta mobilização tem produzido em diversos setores da sociedade, nas famílias e neles próprios. Penso que o CAPS AD, em construção na nossa cidade, pode ajudar muitas pessoas. Um CAPS AD que tenha um terceiro turno, noturno, quando a “fissura” muitas vezes chega e estas pessoas mais precisam de ajuda. Um CAPS AD que tenha assistência clínica para corpos tão desfigurados. Um CAPS AD que trabalhe orientado pela Política de Redução de Danos. Que não exclua ninguém e ajude as pessoas mesmo com suas limitações demasiado humanas. Um CAPS AD que faça consultórios de rua, acompanhando estes usuários onde todos já se desencorajaram, vinculando-se a uma clientela que muitas vezes já desistiu de si mesmos. Como diz Rotelli: “temos que ser mais alegres, vivos, encantadores do que o universo das drogas... Só assim cuidaremos... só assim reabilitaremos e geraremos vida energizada e potente, que permitirá a libertação dos mecanismos autodestrutivos do buraco negro...”

Como nos afirma Che Guevara,

‎"... Para que alcances as estrelas, para que teus sonhos se cumpram, só tens que desejá-los de coração, com todas as forças de tua alma e lutar, lutar sem fraquejar. Ainda que não alcances o topo, a paisagem que se avista desde a montanha, também é magnífica."

Meu muito obrigado.

celso.




COMEMORAÇÕES DE ANIVERSÁRIO DO 1° ANO DO INSTITUTO GREGÓRIO BAREMBLITT!!!


Caros Amigos,

Lembro-me do meu primeiro contato com a Loucura no famoso Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro...

Luci Mara...

Louca, moradora de rua, sem laços familiares, mulher...

A quem tinham tomado o filho por acreditarem que não era CAPAZ de cuidar nem de si mesma...

Tinha engravidado dentro do Manicômio, “lugar de respeito e bons costumes”...

Recebeu-me aos berros...

Tinha mais uma vez perdido alguém...

O residente que acabara de partir...

Depois de algumas semanas...

Passeios à praia, cafezinho no Shopping, coca-cola e cigarros no “Sujinho” (famosa lanchonete do Campus da UFRJ da Praia Vermelha)...

Não mais exclusão social, nem grades, nem maus-tratos...

Amizade, cumplicidade, devir-se outro...

Várias tentativas de alta...

Sempre um não com a justificativa...

Alta para a rua???

Sim, alta para a rua, seu espaço social, sua rede social...

Queria tentar rever a mãe num lichão onde a teria visto pela última vez...

Um namorado que vez ou outra levava cigarros...

Quis o destino que parti da UFRJ, lugar gélido, sem com-paixão pelo outro...

Fui viver a Reforma Psiquiatra no Instituto Municipal Philippe Pinel...

Mas não esquecia Luci Mara ou qualquer outra”Identidade” pois os nomes ela sempre gostava de trocar...

Muitas vezes Maria...

Visitava-a, continuávamos passeando juntos e sempre o café com cigarrinho...

Depois de um tempo, retorno...

Procuro minha amiga, vou a vários quartos da sinistra enfermaria feminina do IPUB...

De tanto chamá-la, uma voz na escuridão me responde...

Chega alguém que rasteja pelo chão...

Minha amiga...

Não me reconhece mais...

Pergunto a alguém o que houve???

Uma briga, fratura da perna, descaso, omissão...

Minha amiga...

Será que um dia terá sua vida roubada de volta???

Hoje, gostaria de dedicar esta Comemoração de Aniversário, a alguém que encarna como o Manicômio pode destruir uma vida tão facilmente...

Luci Mara, dedico este encontro a você, minha amiga...

Vivemos tempos difíceis... Tempo de dores, tempo de indignação...

Fome, miséria... Solidão... Desemprego, corrupção...

Tempos difíceis... Mundo de guerras, de exploração do homem pelo homem e de destruição irracional da natureza.

Um outro mundo é preciso...

Mas, é urgente agir, fazendo do mundo necessário, um mundo possível.

Precisamos fazer possível a liberdade, a solidariedade e a justiça social.

Tempo de dores, tempo de indignação..

Precisamos agir...

Há um ano sonhávamos construir um dispositivo para que pudéssemos exprimir nossos sonhos...

Precisávamos agir...

Não queríamos as velhas instituições, tão instituídas e pouco instituintes...

Professor Gregório Baremblitt nos inspirou...

“Cuidar como se vive, viver como se cura”...

Com esta ética nasceu nosso Instituto!!!

Que recebeu o nome de nosso querido mestre

Sua presença em nossa inauguração, iluminava nossos caminhos...

Punha-se um desafio, fazer jus ao nome que se recebia...

Grande guerreiro da paz e da vida...

Uma ong no processo de libertação.

O público não-estatal, profeticamente, criando já uma molécula do socialismo democrático de uma sociedade sem a opressão de um estado vertical.

Espaço coletivo de produção de um Outro Mundo possível...

Qual caminho seguir???

Um caminho que nos levasse a liberdade, a solidariedade e a justiça social...

Encontramos a arte ou foi ela que veio ao nosso encontro...

Cineclube, espaço-tempo, espaço-movimento...

Linha de potência criativa para a criação de novos devires...

Grupo de estudo, compartilhar um conhecimento, uma experiência...

Produção de novas práticas, busca .de n fluxos desejantes...

Rizomatizando-nos sempre...

Sociedade de amigos...

Temos muitos...

Muitos aqui nesta noite!!!

Meu obrigado a vocês pelo carinho!!!




sexta-feira, 20 de maio de 2011

Conferência de Aniversário do IGB supera expectativa de público



O consultor de direitos humanos, Domiciano Siqueira, apresentou à sociedade frutalense um novo olhar sobre a cidadania em relação à dependência química

Comemorando o primeiro ano de vida do Instituto Gregório Baremblitt (IGB) de Frutal, profissionais da saúde, estudantes da FAF e da UEMG, entre outras pessoas acompanharam a Conferência de Aniversário “A Estratégia de Redução de Danos no Brasil, Experiências Antimanicomiais”, ministrada por Domiciano Siqueira, fundador e presidente da ABORDA (Associação Brasileira de Redutores e Redutoras de Danos – Organização Não Governamental na Área de Redução de Danos).




A palestra de reflexão com a comunidade que lotou a Casa do Advogado na noite da última terça-feira, 17, também comemorou a IV Semana da Luta Antimanicomial de Frutal e I Semana da Luta Antimanicomial do Pontal do Triângulo Mineiro.
Conferencista e consultor de direitos humanos, Domiciano Siqueira, prendeu a atenção de todos com ideias referentes a uma maior sensibilização do público para novas maneiras de lidar com grupos excluídos socialmente. A ênfase da conferência foi com relação a usuários de drogas, mas cujo procedimento é o mesmo para prostitutas, homossexuais, negros, prisioneiros; os chamados grupos de exclusão. Domiciano alertou também para a “desconstrução” de alguns conceitos anteriores a respeito do tema e a criação de novas estratégias que ajudem a cidade de Frutal a enfrentar os problemas decorrentes do consumo de drogas e outros comportamentos, no sentido de diminuir a vulnerabilidade dessas pessoas às doenças comuns como AIDS, hepatite, violência urbana, evasão escolar, entre outros agravantes à saúde geral dos usuários de drogas.
O papel que a saúde pública, justiça e igreja vem fazendo na área da dependência de drogas ou do uso de drogas é histórico, ressaltou Domiciano. “Nós estamos propondo uma política mais ampla e que traga resultados mais eficazes para a sociedade. É necessário ampliar esse olhar, que é o da cidadania de ver o consumo de drogas não como ação de pecado, doença e delito, mas de direito individual”, relatou. Para este novo olhar, o conferencista explica que ações de redução de danos seria a saída e a entrada “para que possamos implantar alguns programas sérios”. “Não dá mais para encher a cadeia de usuários de drogas”, ressaltou Domiciano que é a favor da regulamentação das drogas.




Segundo o psiquiatra do IGB e CAPS Frutal, Celso Peito Macedo Filho, o consultor de direitos humanos contribuiu para que a sociedade frutalense tenha um novo olhar sobre a cidadania em relação à dependência química. “O que talvez mais dificulte a busca de ajuda é a acessibilidade. Visitar onde as pessoas estão seria a estratégia do consultório de rua que muitas vezes é onde as pessoas usam essas substâncias. O que o Domiciano quis passar foi isso, ou seja, onde as pessoas estão fazendo uso da substância para tentar uma aproximação e um vínculo de forma passiva”, declarou Dr. Celso. 
Presente e atento durante toda reflexão, o major da 4ª Companhia Independente da Polícia Militar, Arnaldo Pereira Junior, opinou sobre a polêmica levantada pelo conferencista a respeito da legalização das drogas. Para o major Arnaldo, é um assunto que deve ser amadurecido na sociedade. “Acredito que o posicionamento dele foi muito claro e demonstra que na verdade aquilo que se entende como legalização das drogas não é o que as pessoas esperam; da total liberalidade. O que se espera é que a pessoa faça o uso consciente e responsável, assim como acontece com o álcool e o tabaco”.
No que diz respeito às políticas de redução de danos explicadas por Domiciano Siqueira, major Arnaldo acredita que a evolução do estado tem que, realmente, partir para esta prática de políticas mais voltadas para a cidadania. “É importante que isso seja massificado dentro dessas pessoas que não conseguem se colocar em conformidade com as regras sociais. Essas políticas de minimização de danos vão proporcionar que a sociedade entenda melhor as causas desses fatores e possam se envolver mais”, disse o major da PM.

I Semana da Luta Antimanicomial do Pontal do Triângulo Mineiro

A Prefeitura Municipal de Frutal, Secretaria Municipal de Saúde, CAPS II e Instituto Gregório Baremblitt realizam várias atividades referentes à comemoração da IV Semana da Luta Antimanicomial de Frutal e I Semana da Luta Antimanicomial do Pontal do Triângulo Mineiro. Confira no blog do IGB Frutal mais informações deste importante acontecimento que comemora 10 anos da Reforma Psiquiátrica no Brasil. (igbfrutal.blogspot.com/).

terça-feira, 17 de maio de 2011

OFICINA "REDUÇÃO DE DANOS, UMA ESTRATÉGIA POSSÍVEL" COM DOMICIANO FERREIRA

Caros Amigos, devido ao grande número de inscrições, a Oficina "Redução de Danos, uma Estratégia Possível" foi transferida do Instinto Gregório Baremblitt para a Casa do Advogado, rua Castro Alves n° 110, Centro, Frutal-MG, às 15h30min (próximo ao Fórum e a Prefeitura Municipal de Frutal).

terça-feira, 10 de maio de 2011

I SEMANA DA LUTA ANTIMANICOMIAL DO PONTAL DO TRIÂNGULO MINEIRO

UNIVERSIDADE POPULAR: A UTOPIA NO CAMINHO, UM CAMINHO DA UTOPIA...Jorge Bichuetti

A Universidade Popular Juvenal Arduini (Upop-JA ):

- um espaço público não-estatal, apartidário, de fluxos solidários, uma sociedade de amigos;

- uma educação em movimento; alegre e terna; de experimentações; diálogo e escuta; criatividade; palavra e silêncio;

- um canto da ética: dos direitos humanos, do direito à diferença; do bem comum; do cuidado; da sustentabilidade ecológica; dos bons encontros e das paixões alegres;

- um re-canto dos encantamentos da arte e da arte dos encantamentos;

- um caminho de libertação e a libertação de caminhos...

Lhes convidamos: vamos construi-la juntos.

Ela é triplamente popular: não nega nem secundariza o saber popular; inclui todos como povo da caminhada sem as fragmentações hierárquicas do academicismo; e busca intervir junto às comunidades produzindo vida, liberdade, cidadania e inclusão social...

Sua construção está se dando na própria caminhada. Atualmente, temos quatros espaços coletivos de produção: arte, cuidado, ecologia e práticas sociais. E um cineclube, nela, e um na periferia...

Um sonho se partilhado já é caminho da realidade...

Participe... Divulgue...

" somos todos homens comuns, mas podemos formar uma muralha com nossos corpos de sonhos e margaridas." ( Ferreira Gullar)

Esperamos você... e os seus amigos. Multipliquemos o canto da vida e a luz que no horizonte anuncia um outro mundo possível...


UNIVERSIDADE POPULAR: ENCONTRO NO DIA 14 DE MAIO DE 2011, ÀS 13
 HORAS...

ESPAÇOS DE PRODUÇÃO: ARTE, CUIDADO, ECOLOGIA E PRÁTICAS SOCIAIS.
PLENÁRIA.

CINECLUBE: AMARCORD DE FELLINI...

RUA CAPITÃO DOMINGOS, 1079. BAIRRO ABADIA, MINAS GERAIS . BRASIL.

"... Revolução se faz, fazendo; revolução se faz, partilhando; revolução se faz, dando-se." Hebe de Bonafini, Reitora da Universidad Popular Madres de Plaza de Mayo, Argentina.



domingo, 8 de maio de 2011

NOSSAS ESTRELAS: GOTA D'ÁGUA - CHICO BUARQUE

BULLYNG, ESTIGMA E FASCISMO: A GEOGRAFIA DO CORPO SEVICIADO NAS TEIAS DA OPRESSÃO - JORGE BICHUETTI

Crimes, pânico, tristeza, autoflagelação... Vidas estropiadas nos descaminhos da vida que se impõe como vida normatizada e normatizante, excludente, vida de intolerância com a diferença e a diversidade. Opressão...

Vivemos num mundo de opressão que segrega, marginaliza, discrimina, estigmatiza...

Um mundo branco, de corpos musculosos, magros, de extrovertidos, heterossexuais, pragmáticos... Um mundo de campeões...

O processo de negação dos que escapam ao ideal de normalidade do socius se ´da no cotidiano: violências, ironias, chistes, isolamento, humilhação e tortura psíquica, diuturnamente.

Grava , desenha-se no corpo e na alma as chagas da maldição.

O X-cruz das casas de portadores da peste negra são tatuados no corpo e na alma dos que se vêem seviciados pela estigmatização opressiva e excluídos amargam o isolamento, a desvalia e a solidão.

Acumulam gradativamente no universo íntimo uma confusa e  desesperadora teias de imagens... Eu desprezado; eu violentado; eu indesejado; eu martirizado...

A autoimagem e a autoestima se encontram, então, aniquiladas...

Lhes roubam bens preciosos do existir: a esperança e um futuro; e sentimento de que sou com os outros, sou humanidade...

A violência é uma mutilação dos direitos humanos...

Porém, ela é, igualmente, a explosão e/ou implosão dos violentados que já suportam a opressão que lhes inibem, limitam, destroçam a suas existências.

O bullyng é a manifestação clínica no léxico moderno que escamoteia a sua verdadeira natureza: bullyng é um efeito da estigmatização, da exclusão da diferença, da opressão e dos microfascismos.

Fannon, já em "Os condenados da Terra", que se sofremos cronicamente uma violência vertical, desorganizados e despolitizados, inevitavelmente, produziríamos uma violência horizontal, uma violência dirigida aos nossa iguais...

Melaine  Klein assevera que na agressividade há teste, eu que não creio que estou e que sou capaz de estar no dentro, já que a vida me levou a me sentir no fora,testo a capacidade de ser finalmente incluído num ato explosivo e violento.

Como esquecemos nossos grandes autores do campo da arte:" e qualquer desatenção faça não, pode ser a gota d'água"...

O bullyng hoje interessa a muitos: governo, escola, pais, intelectuais...

Contudo, o vemos no tiroteio; e nem nos damos conta que permeia muitas vidas: nos suicídios, nas overdoses, na morte civil de vidas aniquiladas na desvalia, nas doenças misteriosas onde a própria imunidade reproduz a ataque já rotineiro, e por ser sutil,  despercebido, aceito, banalizado...

Não há solução para o bullyng nos divãs elitista sem que mudemos nosso modo de viver e existir na sociedade...

É preciso fazer caber a diferença...

Urge que reinventemos a sociedade e que ela efetivamente seja inclusiva, cidadã e de alegria...

Não há solução para o bullyng longe de um novo mundo, mundo novo de ternura e compaixão, justa medida e conviviabilidade, carinho, amor, solidariedade, um mundo libertário...

Caímos, todos, no pólo paranóico, quando excluídos, oprimidos, negados...

Não cabe falar em resiliência que é somente o reequilíbrio de quem atacado retoma a mesma vida; é necessário tematizar a resistência, a insurgência e a mudança.

No Bullyng, a vida clama e clama eloquente por uma vida não fascista...




FEZ-SE VINGANÇA, NÃO JUSTIÇA - LEONARDO BOFF


Alguém precisa ser inimigo de si mesmo, e contrário aos valores humanitários mínimos, se aprovasse o nefasto crime do terrorismo da Al Qaeda do 11 de novembro de 2001 em Nova Iorque. Mas é por todos os títulos inaceitável que um Estado, militarmente o mais poderoso do mundo, para responder ao terrorismo se tenha transformado, ele mesmo, num Estado terrorista. Foi o que fez Bush, limitando a democracia e suspendendo a vigência incondicional de alguns direitos, que eram apanágio do país. Fez mais, conduziu duas guerras, contra o Afeganistão e contra o Irã, onde devastou uma das culturas mais antigas da humanidade nal qual foram mortos mais de cem mil pessoas e mais de um milhão de deslocados. 

Cabe renovar a pergunta que quase a ninguém interessa colocar: por que se produziram tais atos terroristas? O bispo Robert Bowman, de Melbourne Beach da Flórida, que fora anteriormente piloto de caças militares durante a guerra do Vietnã respondeu, claramente, no National Catholic Reporter, numa carta aberta ao Presidente: ”Somos alvo de terroristas porque, em boa parte no mundo, nosso Governo defende a ditadura, a escravidão e a exploração humana. Somos alvos de terroristas porque nos odeiam. E nos odeiam porque nosso Governo faz coisas odiosas”.  

Não disse outra coisa Richard Clarke, responsável contra o terrorismo da Casa Branca numa entrevista a Jorge Pontual emitida pela Globonews de 28/02/2010 e repetida no dia 03/05/2011. Havia advertido à CIA e ao Presidente Bush que um ataque da Al Qaeda era iminente em Nova York. Não lhe deram ouvidos. Logo em seguida ocorreu, o que o encheu de raiva. Essa raiva aumentou contra o Governo quando viu que com mentiras e falsidades Bush, por pura vontade imperial de manter a hegemonia mundial, decretou uma guerra contra o Iraque que não tinha conexão nenhuma com o 11 de setembro. A raiva chegou a um ponto que por saúde e decência se demitiu do cargo. 

Mais contundente foi Chalmers Johnson, um dos principais analistas da CIA, também numa entrevista ao mesmo jornalista no dia 2 de maio do corrente ano na Globonews. Conheceu por dentro os malefícios que as mais de 800 bases militares norte-americanas produzem, espalhadas pelo mundo todo, pois evocam raiva e revolta nas populações, caldo para o terrorismo. Cita o livro de Eduardo Galeano “As veias abertas da América Latina” para ilustrar as barbaridades que os órgãos de Inteligência norte-americanos por aqui fizeram. Denuncia o caráter imperial dos Governos, fundado no uso da inteligência que recomenda golpes de Estado, organiza assassinato de líderes e ensina a torturar. Em protesto, se demitiu e foi ser professor de história na Universidade da Califórnia. Escreveu três tomos “Blowback” (retaliação) onde previa, por poucos meses de antecedência, as retaliações contra a prepotência norte-americana no mundo. Foi tido como o profeta de 11 de setembro. Este é o pano de fundo para entendermos a atual situação que culminou com a execução criminosa de Osama Bin Laden. 

Os órgãos de inteligência norte-americanos são uns fracassados. Por dez anos vasculharam o mundo para caçar Bin Laden. Nada conseguiram. Só usando um método imoral, a tortura de um mensageiro de Bin Laden, conseguiram chegar ao seu esconderijo. Portanto, não tiveram mérito próprio nenhum. 

Tudo nessa caçada está sob o signo da imoralidade, da vergonha e do crime. Primeiramente, o Presidente Barak Obama, como se fosse um “deus” determinou a execução/matança de Bin Laden. Isso vai contra o princípio ético universal de “não matar” e dos acordos internacionais que prescrevem a prisão, o julgamento e a punição do acusado. Assim se fez com Hussein do Iraque, com os criminosos nazistas em Nürenberg, com Eichmann em Israel e com outros acusados. Com Bin Laden se preferiu a execução intencionada, crime pelo qual Barak Obama deverá um dia responder. Depois se invadiu território do Paquistão, sem qualquer aviso prévio da operação. Em seguida, se seqüestrou o cadáver e o lançaram ao mar, crime contra a piedade familiar, direito que cada família tem de enterrar seus mortos, criminosos ou não, pois por piores que sejam, nunca deixam de ser humanos. 

Não se fez justiça. Praticou-se a vingança, sempre condenável. ”Minha é a vingança” diz o Deus das escrituras das três religiões abraâmicas. Agora estaremos sob o poder de um Imperador sobre quem pesa a acusação de assassinato. E a necrofilia das multidões nos diminui e nos envergonha a todos.


OSAMA E OBAMA - FREI BETTO

Estranho que a CIA, ao declarar que assassinou Osama Bin Laden, não tenha exibido o corpo, como fez à sobeja com outro "troféu de caça”: Ernesto Che Guevara.

Bin Laden saiu da vida para entrar na história. Até aí, nada de novo. A história, da qual poucos têm memória, está repleta de bandidos e terroristas, cujos nomes e feitos quase ninguém lembra. Os mais conhecidos são o rei Herodes; Torquemada, o grande inquisidor; a rainha Vitória, a maior traficante de drogas de todos os tempos, que promoveu, na China, a Guerra do Ópio; Hitler; o presidente Truman, que atirou bombas atômicas sobre as populações de Hiroshima e Nagasaki; e Stálin.

O perigo é que Osama passe da história ao mito e, de mito, a mártir. Sua morte não deveria merecer mais do que uma nota nas páginas interiores dos jornais. No entanto, como os EUA são um país necrófilo, que se nutre de vítimas de suas guerras, Obama transforma Osama num ícone do mal, atiçando o imaginário de todos aqueles que, por alguma razão, odeiam o imperialismo estadunidense.

Saddam Hussein, marionete da Casa Branca manipulada contra a revolução islâmica do Irã, demonstrou que o feitiço se volta contra o feiticeiro.

Desde 1979, Osama Bin Laden tornou-se o braço armado da CIA contra a ocupação soviética no Afeganistão. A CIA ensinou-o a fabricar explosivos e realizar ataques terroristas, movimentar sua fortuna através de empresas-fantasmas e paraísos fiscais, operar códigos secretos e infiltrar agentes e comandos.

"Bin Laden é produto dos serviços americanos”, afirmou o escritor suíço Richard Labévière. Derrubado o Muro de Berlim, desde 1990 Bin Laden passou a apontar seu arsenal terrorista para o coração de Tio Sam.

O terrorismo é execrável, ainda que praticado pela esquerda, pois todo terrorismo só beneficia um lado: a extrema direita. Na vida se colhe o que se planta. Isso vale para as dimensões pessoal e social. Se os EUA são hoje atacados de forma tão violenta é porque, de alguma forma, eles se valeram do seu poder para humilhar povos e etnias. Há décadas abusam de seu poder, como é o caso da ocupação de Porto Rico; a base naval de Guantánamo encravada em Cuba; as guerras ao Iraque e Afeganistão e, agora, à Líbia; a participação nas guerras da Europa Central; a omissão diante dos conflitos e das ditaduras árabes e africanas.

Já era tempo de os EUA, como mediadores, terem induzido árabes e israelenses a chegarem a um acordo de paz. Tudo isso foi sendo protelado, em nome da hegemonia de Tio Sam no planeta. De repente, o ódio irrompeu da forma brutal, mostrando que o inimigo age, também, fora de toda ética, com a única diferença de que ele não dispõe de fóruns internacionais para legitimar sua ação criminosa, como é o caso da conivência da ONU com os genocídios praticados pela Casa Branca.

Quem conhece a história da América Latina sabe muito bem como os EUA, nos últimos 100 anos, interferiram diretamente na soberania de nossos países, disseminando o terror. Maurice Bishop foi assassinado pelos boinas verdes em Granada; os sandinistas foram derrubados pelo terrorismo desencadeado por Reagan; os cubanos continuam bloqueados desde 1961, sem direito a relações normais com os demais países do mundo, e uma parte de seu território, Guantánamo, continua invadida pelo Pentágono.

Nas décadas de 1960 e 70, ditaduras foram instauradas no Brasil, na Argentina, no Chile, no Uruguai, na Bolívia, na Guatemala e em El Salvador, com o patrocínio da CIA e sob a orientação de Henry Kissinger.

Violência atrai violência, dizia dom Helder Camara. O terrorismo não leva a nada, exceto a endurecer a direita e suprimir a democracia, levando os poderosos à convicção de que o povo é incapaz de governar-se por si mesmo.

Vítimas inocentes não podem ser sacrificadas para satisfazer a ganância de governos imperiais que se julgam donos do mundo e pretendem repartir o planeta como se fossem fatias de um apetitoso bolo. Os atentados de 11 de setembro de 2001 demonstraram que não há ciência ou tecnologia capaz de proteger pessoas ou nações. Inútil os EUA gastarem trilhões de dólares em esquemas sofisticados de defesa. Melhor seria que essa fortuna fosse aplicada na paz mundial, que só irromperá no dia em que ela for filha da justiça.

A queda do Muro de Berlim pôs fim ao conflito Leste-Oeste. Resta agora derrubar a muralha da desigualdade entre Norte-Sul. Sem que o pão seja nosso, nem o Pai e nem paz serão nossos.



quinta-feira, 5 de maio de 2011

NOSSAS ESTRELAS: CAIS - ELIS REGINA

Os 10 anos da reforma psiquiátrica no Brasil

Autor: 
 
Apesar de discutida há mais de duas décadas no Brasil, a reforma psiquiátrica completa, neste mês, apenas 10 anos. Formalizada em 2001, a lei nº 10.216 estabeleceu as diretrizes da saúde mental no país, moldurando uma nova estratégia, fundada na humanização do tratamento e na formação de uma rede, cujo núcleo deixou de ser o hospital.
Defensor desse modelo, o governo federal criou, em 2003, o programa De Volta Para Casa, que hoje atende mais de 3,7 mil brasileiros em 614 municípios, sendo 19 habilitados pelo Ministério da Saúde. Baseado na lógica da descentralização, o programa concede um auxílio de R$ 320 aos pacientes que receberam alta da internação psiquiátrica. Segundo informações do ministério, em 2010, foram investidos R$ 13,8 milhões no De Volta. Para a atenção especializada, foram consolidados os Centros de Atenção Psicossocial (os CAPS), que atualmente são 1.620 – número quatro vezes maior que em 2002, quando se registravam 424 centros.
O modelo, entretanto, é ainda questionado por muitos profissionais da área de saúde, que não concordam com o processo de “des-hospitalização”, que estaria sendo provocado pela desistitucionalização – bandeira da reforma.
Em entrevista ao Brasilianas.org, o novo coordenador de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Roberto Tykanori explica porque o modelo atual é o melhor e qual os problemas que ainda devem ser enfrentados. “A questão de des-hospitalizar, dentro da reforma, é uma etapa para você atingir os objetivos mais importantes”, afirma.
Confira abaixo os principais momentos da entrevista.

Obra de Carlos Pertuis, do acervo do Museu de Imagens do Inconsciente. Pertuis foi paciente de Nise da Silveira, fundadora do museu, psiquiatra brasileira e aluna de Carl G. Jung

Brasilianas.org - A desistitucionalização, promovida pela reforma psiquiátrica no país, diminuiu o número de leitos da saúde mental, tirando o hospital do centro do tratamento de pacientes. Mas esse processo não tem caminhado para uma “des-hospitalização”?
Roberto Tykanori – São duas coisas diferentes. Des-hospitalizar é realmente um processo que ocorre de retirar as pessoas dos hospitais. Essa idéia tem vários aspectos, sendo que o principal é mudar o eixo do atendimento e o eixo do investimento. Isso tem a ver com a mudança de modelo, porque significa sair do raciocínio centrado no hospital, e construir outro tipo de modelo. Existe uma dimensão, dentro da palavra “des-hospitalizar”, que é a seguinte: descentralizar o recurso que concentrado no sistema hospitalar. Ou seja, tem o aspecto de des-hospitalizar o dinheiro.
 Do ponto de vista do desenvolvimento da política, é crucial você conseguir transferir recursos de um sistema, que já está aplicado e concentrado num sistema hospitalar, para outro sistema, que tem outro modo de raciocinar. A questão de des-hospitalizar, dentro da reforma, é uma etapa para você atingir os objetivos mais importantes. Estamos saindo de um modelo que era concentrado, tanto de recursos, como de pessoas. Havia uma distribuição de recursos para poucos lugares, e as pessoas que tem acesso a esses lugares ficam super-concentradas num mesmo ponto. O modelo novo descentraliza o recurso, para facilitar o acesso e torna os espaços de atendimento não concentracionários. Os pontos passam a ser de convívio.
Passa-se, também, a mudar o foco, para cada vez menos nas situações extremas, para cada vez mais olhar e apoiar os pacientes no seu cotidiano. Passa a haver a possibilidade de atendimento nas situações cotidianas. Em 2002, houve 460 mil atendimentos; em 2010, com essa descentralização e esse processo de transferência de recursos para uma rede nacional, aumentando o acesso e a oferta, fizemos 21 milhões de atendimento.
Mas apesar dessa descentralização, o que se verifica, em outros países, é que modelos desse tipo esbarram nos contingentes de doentes mais graves, que não conseguem viver sem supervisão institucional. Não há esse problema aqui?
Por que temos 21 milhões de atendimentos? Não significa 21 milhões de pessoas; significa o conjunto de atendimentos muito mais denso e intenso. Tem pessoas, que precisam passar pelo atendimento apenas uma vez por mês, mas outros precisam de atendimento cotidiano, de cuidados intensivos. Antes, como eu disse, havia uma concentração muito grande de recursos e de pessoas, mas pouquíssimos profissionais na rede. Hoje, temos uma quantidade enorme de pessoas ofertando atendimento. No aspecto concentracionário, você tinha parentes para tomar conta das pessoas e pouquíssimos funcionários. No modelo atual, cada vez mais fazemos um rede de pessoas.
Em entrevista a este blog, o ministro Alexandre Padilha falou da necessidade de se organizar as redes de atenção do SUS, promovendo a regionalização do sistema. Como tem sido trabalhado o atendimento básico em saúde mental nas redes interfederativas do SUS, uma vez que o foco de muitas delas tem sido a alta complexidade?
Este é um ponto importante. Estamos numa fase em que o sistema está crescendo, mas ainda depende de processos de investimentos. De fato, precisamos avançar na integração de conceitos e práticas junto à atenção primária. Porque, assim como a atenção primária vai ser um reposicionamento, este reposicionamento envolve estabelecer colaboração e sinergia com o sistema de saúde mental, para que a gente atinja, capilarmente, cada vez mais pessoas. Quando o atendimento à saúde mental e a atenção básica estão bem próximos das pessoas, você pode lidar com as situações de conflito da vida cotidiana e real das pessoas. Isso significa ter uma estratégia de atender preventivamente. É um aprimoramento do sistema.
Um ponto que alguns especialistas criticam do sistema de saúde mental brasileiro se refere à ausência da prevenção secundária. O ministério tem se preparado para esta etapa do atendimento?
Quando pensamos em prevenção secundária, é só de trabalho ambulatorial, e isso se mostra, historicamente, ser insuficiente. Como já falei aqui, deve-se colocar o foco no dia-a-dia do paciente, e não apenas no transtorno mental agudo. E o dia-a-dia é difícil. Então, a rede, além de atender principalmente casos graves e de ruptura, o fundamento mais importante é a continuidade do atendimento e da atenção. E isso só se dá em rede.
Por isso que se pensa que, além dos gastos, você tem procedimentos terapêuticos, centros de convivência, você busca ter oficinas de trabalho. Essa composição garante trabalho, renda, lazer e tratamento. Esse tipo de coisa é que vai gerar aquilo que se chama de prevenção secundária, ou seja, a sustentabilidade das pessoas, evitando recaídas ou crises mais prolongadas.
O Brasil possui um sistema básico de prevenção de doenças mentais? Há doenças que, apesar de mentais, podem ser evitadas, como depressão pós-parto ou alguns quadros maníacos.
No caso específico das mulheres grávidas, foi lançada recentemente a chamada Rede Cegonha, que é uma proposta ampla de reorganização da atenção às mulheres grávidas. Um dos componentes é o investimento na qualificação e aprimoramento e passa exatamente por isso. Um dos critérios, que vai ser adotado daqui para frente na rede, é que mulheres que tenham passado histórico de problema mental devem ter histórico de depressão. Ou casos de saúde mental, passam a ser considerados um risco. Ela [a mulher] passa a ser observada durante a gravidez e depois do parto com um protocolo diferenciado.
Isso no caso da depressão na gravidez. Mas casos mais graves de outras psicoses recebem a mesma atenção? A internação hospitalar de urgência, por exemplo, é realizada?
A situação da prevenção é a seguinte: quando você vai atender as pessoas, e está cada vez mais perto, a ação é intervir de fato nos conflitos menores, nas situações de menor complicação...
E as de maior complicação?
É como se fosse o efeito de cascata. Interferindo num problema menor, você evita que ele cresça. Tem problemas que vão crescendo, à medida que elas pedem atendimento. Prevenção é você ajudar a superar essas dificuldades no cotidiano. Faz parte das novas diretrizes qualificar os prontos-socorros - em casos de ruptura, o paciente é encaminhado para lá. Atualmente, temos centrado nos prontos-socorros especializados. Nesse primeiro atendimento, o paciente é atendido por especialistas ou não-especialistas. E ali, a gente precisa qualificar, de fato, esse processo. Vai haver um processo de reorganização das portas de emergência, o que envolve uma qualificação de todos os pontos de atendimento dos casos mais agudos.
Pode-se dizer que um dos obstáculos do tratamento da saúde mental é a dificuldade de se definir diagnósticos quando a doença ainda está na fase inicial?
Na questão específica da depressão, é importante colocar, pois há mudanças de aspectos da doença, que atualmente merecem uma inflexão. Nos últimos meses, diversas pesquisas, particularmente americanas, que mostram que a grande parte da população que atualmente está sendo medicada com esse discurso preventivo, nos EUA, tem os efeitos equivalentes a um placebo. Não significa que seja inócuo, mas se trata de placebo. Isso começa a jogar luz na necessidade você reorganizar o sistema, pois são milhões de pessoas (da população e de parte dos profissionais também) que, culturalmente, entendem que basta tomar um remédio, pois ele ou previne ou trata rapidamente.
Essas pesquisas mostram equívocos, porque os remédios custam caro para as pessoas. A eficácia desses remédios é questionada. A rigor, estamos retomando paradigmas de atendimentos mais antigos, que eram mais fracos, na verdade.
Hoje, em alguns casos, a primeira medida é passar 30 dias de apoio psicossocial, e não entrar com médico. Porque aí outras pesquisas mostram que essas abordagens sociais tem mais efetividade e eficácia do que o procedimento de medicação. Por outro lado, existem outras indicações de que introduções de remédios, em situação em que são desnecessários, acabam gerando, ao longo do tempo, crises piores. Isso é uma mudança de eixo que vem sendo feita com amplos debates.
Qual a base conceitual da reforma brasileira? Ela é totalmente influenciada pelo movimento italiano, de Franco Basaglia?
A boa coisa do Brasil é que, como ele entrou na reforma bem a posteriori, depois da reforma nos EUA, da França e da Itália, isso permitiu à gente fazer um amálgama daquilo que tem de interessante e positivo dessas diversas experiências. A experiência italiana é análoga, de certa forma. Ela é tardia, se comparada com os outros países. O que o Basaglia promoveu foi, de certa forma, o que o Brasil fez, ou seja, tirou o que havia de interessante das experiências anteriores. Aprender com o Basaglia é “vamos aprender com todo mundo”. Aprendemos a copiar assim como os italianos aprenderam.
Qual a contribuição do movimento psicanalítico na formação da reforma? Consegue-se pensar na psicanálise dentro das políticas de saúde mental?
O campo da psicanálise é bastante heterogêneo. Mesmo dentro da psicanálise existem muitas “psicanálises”, o que abre espaço para muitas incongruências dentro dela. As contribuições que foram sendo absorvidas foram, ao longo da história, mostrando a importância de que o psiquismo não é uma coisa a ser deixada de lado – as pessoas possuem uma vida interior, tem idéias, desejos, e isso é um ponto para tratarmos de alguém. No âmbito geral, a psicanálise enriquece a cultura do cuidado e do atendimento. Como tecnologia, há vários tipos de profissionais – o lacaniano, o freudiano etc. – não necessariamente é uma ferramenta a ser utilizada como estratégia única para o planejamento da saúde mental.
O ministério sabe onde estão os loucos, genéricamente falando, do Brasil? Aqueles que estão nas ruas e nas cadeias, como podem ser identificados e tratados?
Para se ter idéia, 3% da população teria algum tipo de problema grave. No Brasil, temos cerca de seis milhões de pessoas nas ruas. 3% de 200 milhões de brasileiros é seis milhões. Então seria quase metade de São Paulo distribuída por aí, sé de casos graves. Dos casos leves, seriam mais 9%, ou seja, aproximadamente 20 milhões. Assim, um em cada dez brasileiro, talvez, está na rua, louco. Então, essa é uma imagem equivocada, dizer que a maior parte dos loucos está nas ruas.
Muita gente que está na rua tem problema, isso é verdade. Certamente, de modo grosseiro, 90% tem problema com álcool. Só o fato de estar na rua, aumenta a vulnerabilidade, e a pessoa piora bastante. Mas, do ponto de vista de uma política pública, primeiro as pessoas precisam sair da rua. Nesse sentido, o governo está desenvolvendo uma estratégia, com a coordenação do Ministério do Desenvolvimento Social, de combate à miséria. Existe o Plano Nacional para a população de rua, cuja implementação está sendo feita gradualmente.